sexta-feira, 11 de agosto de 2017

Salvação


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Um Deus Desconhecido escutou as minhas preces de ontem, que eram sem fé. Pousou-me na areia, no dia seguinte, para que eu pudesse recordar a rebentação das ondas, o aroma das algas, os reflexos infinitos de sol no mar, debaixo do corpo uma toalha verde-água, nas mãos o livro de Steinbeck, ao meu lado o homem que partilha a minha vida, quando ambos nos cruzamos no mesmo universo de vontades, no mesmo tempo, no mesmo lugar.
Um fim de tarde perfeito, quando o vento já arrepiava a pele: ameijoas à Bulhão Pato e um vinho branco alentejano, na companhia de amigos que, em boa hora, encontrámos, antes de entrar na marisqueira cujos donos tratamos por "tu", apesar de o ritmo de visitas e de consumo ficar muito aquém daquele que seria desejado.
Há dias que são uma espécie de salvação, por mais modestos. Um passo atrás no precipício de uma não-vida.
Hoje vivi.  

quinta-feira, 10 de agosto de 2017

Suspiros

A escrever sem pensar no que tenho para dizer, receio descobrir-me seca, nada existir digno de dizer. Avoluma-se uma não-vida, que me esvazia, a calar todas as letras. Fico à espera que algo aconteça e nada, é uma paragem cardíaca nos dedos, a paralisia do pensamento, o desalento levou a luz inteira e na penumbra não consigo caminhar sem cair. Deixo que os dedos dancem no teclado, é um cliché, um cliché, fugiram-me as palavras mais húmidas, tudo o que tenho chega-me aos dedos desidratado.
Agosto a um terço, os outros, que vivem, a banhos, e eu em seco, só a água insossa e o vinho, o café e o chá, o sumo, sem onda nem espuma, sem barcos nem velas, sem algas ou o piar das gaivotas nem nada, sem braçada nem sol, da esperança, o queixume. Mais um Verão desperdiçado. Vida sem vida, só o suspiro que traz a miragem da beira-mar, onde não estou.
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